Quinta-feira, 17 de Março de 2005
Tinha vinte anos quando o conheci.
Era ainda uma menina.
Lembro-me dele ter entrado no escritório, que meses mais tarde, prolongando-se até hoje, iríamos partilhar.
Altivo, sobranceiro até, quase nem respondeu ao meu cumprimento formal e obrigatório.
Para ser sincera acho que nem me olhou.
Anos mais tarde dir-me-ia que, nesse dia, me sentiu de uma forma estranha, inexplicável até
De qualquer forma disfarçou bem, pois não me recordo de o ver a olhar-me.
Quando o vi pela primeira vez olhei e voltei a olhar, querendo reafirmar a impressão que me deixarias ficar para sempre.
Alto, moreno, olhos escuros, confiantes, seguro de si mesmo. Emanava orgulho e poder
Tinha trinta anos.
Ainda não sabia mas adivinhava nele uma carga de trabalhos nos tempos que se seguiriam.
Lembro-me de ter pensado que eras demasiado igual ao meu primeiro amor.
Foi um pensamento rápido, fugaz até, como se não quisesse recordar um passado ainda recente. Esse pensamento viveu comigo em cada segundo de convivência, escondido no mais intimo do meu ser, servindo como pêndulo de segurança no meu relacionamento contigo, durante anos.
Foste embora, nesse dia, e quando saíste respirei fundo, quase como se me libertasse de um opressor, como se de repente tivesse de lutar para viver.
Voltaste dias depois, acompanhado do teu filho mais velho. Uma cópia em miniatura do pai que o segurava pela mão.
Nesse dia olhaste para mim, sorrindo, orgulhoso do menino que levavas pela mão. Ou talvez não. Talvez fosse mais o orgulho de ser pai e a segurança de saberes ser amado.
Disseste bom dia.
Acho que foi nesse dia que te tive a certeza da pessoas que eras. Às vezes, espantado, achas estranho o muito que te conheço, e acredito que, nessas alturas, me achas diferente, especial, única talvez.
Nesse dia percebi que, bem escondido, atrás das tuas máscaras, dos teus modos, revelados nos anos que se seguiram, eras apenas um homem que amava, mas mais do que isso querias ser amado.
E querias saber que o eras, por quem e como
Meses mais tarde, talvez em Junho, entraste ao serviço da empresa.
Será que sabíamos a importância que a existência de cada um de nós teria na vida do outro?
Talvez não.
Talvez sim.
O futuro dá-nos sempre a resposta.
Sem mentiras.
Com toda a verdade.